Avelino Ferreira, 63 anos, brasileiro, casado, sete filhos, sete netos. Jornalista; escritor; professor de Filosofia.







terça-feira, 13 de novembro de 2012

Modesto da Silveira, um nome para ser sempre lembrado


O advogado Modesto da Silveira, o mais notório defensor de presos políticos durante a ditadura brasileira, ex-deputado federal, e que agora integra a Comissão de Ética Pública da Presidência da República, nomeado em setembro pela presidente Dilma Roussef, será homenageado hoje, na Sede do Conselho Federal da OAB. O ato é intitulado 'Memória à advocacia da resistência política' e representa uma contribuição da entidade ao resgate da história brasileira desse período.
Durante a cerimônia, o presidente da OAB do Rio prestará homenagem a Modesto da Silveira, considerado por vários juristas como o advogado que mais defendeu perseguidos durante a ditadura. Nos tribunais, o homenageado pregou a anistia ampla, geral e irrestrita aos perseguidos políticos. Já no declínio da ditadura, foi o candidato mais votado para deputado federal do Rio de Janeiro. No Parlamento, ampliou sua luta pelos direitos humanos.
Antônio Modesto da Silveira nasceu em 1927, no município de Itabirito, em Minas Gerais. Filho de lavradores sem-terra, desde criança teve de ganhar a vida como lavrador e ajudante de carro de bois. Aos 9 anos, era operário de pedreira, voltando, por vezes, à lavoura. Foi engraxate, lenhador e guia do cego Benedito Fonseca, que terminou por guiar seu pequeno guia, ajudando-o a entrar na escola.
Modesto da Silveira foi também da Marinha Mercante, professor, tradutor e jornalista. Ao se formar em Direito, quase à época do golpe de 64, dedicou-se à defesa dos presos e perseguidos políticos. Perseguido por causa da sua atuação corajosa, ele e suas filhas menores sofreram todo tipo de ameaça. Em 1970 foi sequestrado por agentes do DOI-CODI da rua Barão de Mesquita, no Rio de Janeiro, mas liberado após ameaças (não tortura), talvez devido a agilidade de diversos advogados importantes, inclusive de instituições internacionais de Direitos Humanos. 
Conheci Modesto da Silveira nas lutas contra a ditadura militar. Era seu admirador e o entrevistei algumas vezes. Quando ele esteve em Campos para falar sobre o Projeto Jari, que escravizava e torturava pessoas no Pará, publiquei sua entrevista e, dias depois, o deputado Alair Ferreira, defensor da ditadura e do Projeto Jari, do Daniel Ludwig, chamou a imprensa para dizer que Modesto havia mentido e que nada do que denunciara acontecia. Ao arguir o deputado, quase apanhei dele e de seus capangas. Meus colegas jornalistas ficaram contra mim, porque Alair não podia ser contestado... 
Depois fui proibido de entrar nas dependências do "Complexo de Comunicação Alair Ferreira" que compreendia a TV Norte Fluminense (hoje, Record), Rádio Cultura e Rádio Jornal Fluminense.  Aliás, fui expulso da Campos Difusora, da Continental, demitido por Hervé Salgado do jornal A Notícia... mas já é outra história...
Modesto da Silveira, advogado, histórico defensor de direitos humanos e de vítimas da ditadura militar, é um arquivo vivo das lutas de resistência ao regime ditatorial que sufocou as liberdades no Brasil entre 1964 e 1985. Foi ameaçado, perseguido, preso e torturado. Pelo delito de ousar defender presos políticos.
Modesto da Silveira: se Brecht estivesse vivo, o chamaria de imprescindível. (Foto: Rogério Tomaz Jr. em 31/08/2011 e úblicada no site Conexão Brasília Maranhão)
A foto é de uma audiência pública realizada hoje (31/08/2011), na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, que debateu com a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça diversos processos de anistia política ainda não contemplados pelo Estado brasileiro. No exato momento do clique, Modesto se emocionava ao relatar o caso de uma militante que foi estuprada em fila por policiais militares em Pernambuco. Na frente do marido.
Abaixo, alguns pequenos trechos de uma entrevista de Modesto a Ana Helena Tavares: 
 “Fui muito solicitado. Defendi muita gente do Oiapoque ao Chuí, de Belém a Porto Alegre”, mas pondera: “Tive colegas que me ajudaram também. E, assim, realmente deu para defender milhares de pessoas. Ninguém tem estatística das vítimas e perseguidos, mas posso calcular mais ou menos em centenas de milhares. Ou milhões, se considerarmos que os familiares também foram atingidos indiretamente”
A maldade desorganizada
“Aqui, além da organização da maldade, que há em todas as ditaduras, havia a maldade desorganizada de cada doente mental que seqüestrava, torturava e matava. Ele era dono da sua liberdade, da sua moral e do seu corpo. Assim, quando, por exemplo, seqüestravam uma mulher jovem e atraente, iam desnudando logo. Para observar, comentar, manusear e usar como objeto de sexo e de violência. Tanto que eu tive clientes que se engravidaram. Se a gente pudesse reproduzir tudo daria uma enciclopédia do terror que dificilmente você vê igual na história da humanidade.”
A luta pela anistia
“A anistia é uma tradição multi-milenar dos povos considerados civilizados para os chamados “crimes evolutivos”: aqueles que chegam a cometer algum abuso ou excesso por uma finalidade maior e política. E o Brasil só conseguiu essa anistia depois de 21 anos de uma ditadura sanguinária e mortífera. Ditadura que foi se desmoralizando, foi tendo que se repensar e sofrendo pressões internacionais.”
“Até o papa (João Paulo II) fez um discurso com recado (indireto) dizendo: ‘É preciso que o maior país católico do mundo pare de praticar tantas desumanidades’. Quando o papa ousa fazer isso, é porque estava demais. E o mundo estava estarrecido. Depois (de 79), as outras ditaduras da América Latina caíram em dominó.”
A ocultação de cadáver
“Isso houve centenas. Em Petrópolis, há uma “Casa da Morte”. Quantas pessoas foram assassinadas ali e onde estão os corpos? Eles usavam mil modos… Seja jogar no fundo do mar, seja enterrar no interior de uma floresta qualquer.”
A morte brutal do ex-deputado David Capistrano
“Por exemplo, o ex-deputado David Capistrano, tem informação concreta de que ele foi não só torturado, como levado morto até a “Casa da Morte”, onde foi esquartejado, como fizeram com Tiradentes. E mais do que isso: depois, picotaram pendurando em ganchos de açougue, num varal, para terror dos demais que passassem por ali. A família está aí e quer saber: onde estão os pedaços, os ossos do esqueleto de um homem que foi deputado, que foi uma autoridade, um líder político? Cadê? Isso sem falar em Rubens Paiva e outros…”
(*Ana Helena Tavares é editora do site “Quem tem medo da democracia?” )




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