Fotos: Mauro de Souza/ Thiago Macedo
Lideranças do MST nacional compareceram ao enterro no Campo da Paz
“A cada companheiro tombado nenhum minuto de silêncio, mas toda uma vida de luta”. Assim familiares, dezenas de companheiros e representantes do movimento sem terra da região e do país, prestaram suas homenagens ao companheiro e coordenador do movimento regional Cícero Guedes, de 49 anos, no velório da capela do cemitério Campo da Paz.
A cerimônia, que começou por volta das 13h, foi marcada por choro, mas também por canções que fizeram lembrar os momentos vividos pelo líder, sempre qualificado por sua insistência e perseverança em querer promover justiça social, com a reforma agrária e a partilha da terra.
Segundo um dos filhos, Jucimar Guedes, de 21 anos, que esteve ao lado de seu irmão e de sua mãe, Cícero recebeu uma ligação pela manhã do dia do crime (25/01) chamando para ir a Usina Cambaíba.
“Parecia que ele não queria ir. Depois da ligação ele ficou pensativo, ligou a televisão e depois avisou que estava indo a usina. Fez contato quando chegou à rodoviária. Ao chegar almoçou na casa de um dos companheiros e pegou a bicicleta emprestada de alguém. Essa bicicleta não foi vista junto ao corpo e por isso pensaram que ele estava a pé quando o crime aconteceu. Ele era um grande homem, só queremos justiça”, disse o filho.
Para outro coordenador regional, Emerson de Oliveira, quando o estado na figura da federação e da municipalidade não criam condições reais de sustento para essas famílias sem terra.
“Sair de um barraco de lona para um sítio não é dar condições de vida. É necessário construção de estrada, escolas, posto de saúde, assistência técnica, é por tudo isso que Cícero lutava. A reforma agrária seria melhor para a população do campo, assim como se evitaria a favelização na cidade, já que o fluxo de pessoas do campo vão buscar por melhorias nos grandes centros. Falta compromisso dos governos com o agronegócio. Se a justiça social fosse promovida, através da reforma agrária essa rixa entre sem terra e latifundiário amenizaria e não haveria tantas mortes no campo, muitas nem são apuradas. As consequências dessa morte é que serão determinantes, se a polícia deixar impune estará credenciando outras desgraças na região”, disse.
Segundo o diretor nacional do MST Marcelo Durão, aos oito anos de idade Cícero já era forçado pelos latifundiários a trabalhar no corte de cana.
“Ele passou por Mato Grosso e Rio de Janeiro e em 1997 na usina São João passou a ser referência do MST. A opressão e ameaças faz parte desse jogo político, mas o sentimento de luta é maior, ele ensinou que o movimento social move o ser humano, era admirável seu modo de tratar a terra, a organização do lote, sabia respeitar a importância da terra, esses são os seus legados”, disse.
O superintendente do Incra no Rio de Janeiro, Gustavo Noronha, esteve presente e disse que medidas estão sendo tomadas em resposta dos 14 anos em que o caso da usina esteve parado na justiça.
“Lamentamos a morte desse grande homem e o que podemos dizer é que os passos que nós demos em 2012 foram importantes para nos permitir a atuar em 2013 junto com a organização estadual. O Incra vem examinando o processo necessário para indenizar aos proprietários de terra e pra isso o órgão reservou R$13 milhões. A previsão é que até fevereiro seja ajuizada e protocolada uma ação que permitirá a emissão de posse das 111 famílias”, disse.
Também estiveram presentes o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), deputado Marcelo Freixo, o delegado do Ministério do Desenvolvimento Agrário, José Otávio, o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil- Seção Rio de Janeiro (OAB-RJ), Felipe Santa Cruz e o Senador Lindberg Farias, que não pode estar presente, foi representado pela ex-vereadora Odisséia Carvalho, também do Partido dos Trabalhadores (PT), que leu uma carta enviada pelo Senador.
"A discussão sobre a minha presidência dos direitos humanos na Alerj é o que menos importa nesse momento e pra ser um militante desses direitos não preciso estar no cargo, é claro que ações facilitam. Mas existe essa possibilidade sim, e a tentativa de enfraquecer a assembleia que não só me atinge, mas como também enfraquece essa luta pelos diretos humanos, consequentemente, um dano à toda sociedade", enfatizou Marcelo Freixo.
A professora do curso de serviço social da UFF de Campos, Ana Costa, lamentou a morte do amigo.
“Depois de ver o corpo do meu amigo estirado no chão, uma morte provocada covardemente, não posso me calar. Ele era uma pessoa que tinha um projeto claro de sociedade, que não é essa que vivemos hoje. A sua luta é de generosidade e amor, porque ele já era um assentado pelo Zumbi dos Palmares, mas queria que a terra fosse partilhada para todos. Como professora, não consigo imaginar o saber acadêmico sem a lembrança desse grande homem, que dá vida a terra, como um bem natural e não mercantil”, disse.
(Matéria extraída do jornal Ururau)
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