Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira do Mato Dentro - MG, em 31 de outubro de 1902 e morreu em 17 de agosto de 1987. De uma família de fazendeiros em decadência, estudou na cidade de Belo Horizonte e com os jesuítas no Colégio Anchieta de Nova Friburgo RJ, de onde foi expulso por "insubordinação mental". Mas formou-se em Farmácia em Ouro Preto, em 1925 e foi para o Rio em 1934. Eu o cinheci e passei a admirá-lo no início da década de 1970, quando escrevia para o Jornal do Brasil.
Seu poema que mais me marcou (não o melhor, nem o mais marcante em sua carreira, obviamente, mas tinha tudo a ver com meus 20 anos e a busca de um caminho) foi José ou "e agora, José?" que foi popularizado na voz de Paulo Diniz.
Aliás, esse poma de Drummond e as personagens de Graciliano Ramos em Vidas Secas me fizeram buscar entender o existencialismo e, anos depois, caíram como uma luva na minha dissertação sobre a condição humana. Mas isso é outra história, quando quero aqui apenas registrar minha admiração por um dos maiores poetas brasileiros. E com o poema José:
JOSÉ
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta,
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?
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