Lá como aqui, embora a desigualdade no Brasil, uma das maiores economias do mundo, seja infinitamente maior que a dos EUA. De qualquer maneira, vale a conferida nessa reportagem do New York Times reproduzida pela Folha de São Paulo sobre os "efeitos sociais" da "Tempestade Sandy" , lembrando que o furacão Catarina já havia revelado a pobreza e miséria de muitos americanos.
A tempestade Sandy separou os nova-iorquinos que têm eletricidade, calefação e as muitas outras certezas da vida moderna dos que não têm. Ficaram mais visíveis as linhas divisórias de uma cidade há muito tempo fraturada por classe, raça, etnia, geografia e cultura. Ao lembrar essas divisões, a tempestade provocou a esperança de que elas pudessem ser superadas.
Os nova-iorquinos mais privilegiados desencavam uma profunda culpa das pilhas de roupas doadas quando ficam cara a cara com a pobreza tão perto de casa, que já existia antes da tempestade. Os que procuram ajuda temem que seus benfeitores tenham algum interesse voyeurístico em seu sofrimento, "como se estivéssemos em um zoológico", disse um morador de um conjunto habitacional em Rockaway.
Embora o bem praticado seja inegável, o clima de superação de lacunas tem um súbito tom melancólico para alguns, nos dois lados, que têm a certeza de que o momento é passageiro.
De seu apartamento em Manhattan, onde ficou sem energia durante vários dias, Kelly Warren, 48, e uma amiga carregaram 500 pares de meias e roupas íntimas novos, comprados no Walmart, para moradores de Rockaway. "Vim dirigindo meu Lexus até aqui", disse Warren, revelando sua autoconsciência enquanto as pessoas vasculhavam as roupas doadas. "Eu pensei: graças a Deus que o carro está sujo."
Uma cena semelhante se desenrolava à sombra das Red Hook Houses, um projeto habitacional com quase 3.000 apartamentos. Marcada não apenas pela desigualdade de renda generalizada, mas também pela marcha constante das reformas e da invasão da classe média nessa área antes decadente, alguns acharam difícil aceitar a ajuda dos mesmos jovens que estão pagando mais para morar aqui, expulsando antigos moradores do bairro. Perceber que esse grupo demográfico, há muito tempo considerado o vilão, se importava foi igualmente difícil para alguns moradores.
"Eles falam mal dos brancos há tanto tempo que se sentem envergonhados", disse Al Pagan, 46, enquanto olhava os voluntários ajudarem seus vizinhos. "Eles começam a perceber que os brancos são seres humanos como nós."
Momentos de entendimento surgiram não apenas ao longo das linhas da raça, mas também nas fronteiras menos evidentes de classe e cultura. Enquanto vários jovens de uma empresa de consultoria em Manhattan, um deles usando uma camiseta da Universidade Princeton, demoliam um piso destruído, qualquer tensão pareceu ser descartada com o primeiro carrinho de entulho. Alguns voluntários entraram na área mais frágil de aplicar seus próprios valores às pessoas a quem estão ajudando.
Enquanto distribuía fraldas e caixas de comida para bebê, Bethany Yarrow, 41, uma cantora folk de Williamsburg que se apresentou como voluntária com outros pais da escola particular que seus filhos frequentam, disse estar chocada com tantas mães pobres na região de Arverne que não amamentam. Ela disse que o grupo está trabalhando para trazer uma consultora de lactação. "Isso não é apenas dar algumas fraldas e voltar para casa", disse.
Esse tipo de reação irritou Nicole Rivera, 47, que vive em um conjunto popular em Arverne. "É triste, às vezes é um pouco degradante", disse. Rivera disse que está agradecida pela ajuda, mas que as pessoas brancas de classe média e alta a deixam com raiva.
"A única vez em que vocês nos reconhecem é quando há um desastre", disse. "Por que esperar pela tragédia? As pessoas sofrem todos os dias aqui."
(Trecho de reportagem de Sarah Maslin Nir para o New York Times)
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