Amanhã, dia 20, é dia de São Sebastião, com as festividades no distrito homônimo na Baixada. Se no Rio de Janeiro o santo ganhou feriado, por aqui anda meio esquecido, na sombra de Santo Amaro. Para quem se interessa pelas histórias ou lendas cristãs, a leitura do texto abaixo é interessante. Registre-se que as comemorações a São Sebastião começaram em 1786, sendo uma das mais antigas festas religiosas de Campos.
Sebastião
Cristão
da Era dos Mártires
O
cristianismo foi transformado e solidificado por intermédio de Saul (ou Saulo,
nome judeu) ou Paulo (nome romano), da cidade de Tarso, região da Cilícia,
território da Turquia. Saulo (ou Paulo) era um pensador que, após perseguir os
cristãos, abraçou a causa de Joshua ou Jesus, de Nazaré, e fez as alterações
necessárias à fundamentação de uma religião, mantendo a base das pregações
originais daquele homem que condenava a escravidão e a riqueza. O cristianismo
de Paulo, porém, além de não condenar a riqueza, admitia a escravidão. Com
Paulo o cristianismo cresceu tanto que seus opositores sentiram-se ameaçados; e
as perseguições aos cristãos foram se intensificando.
Durante os últimos anos do império
de Diocleciano (284 a 311), a perseguição aos cristãos foi implacável.
Diocleciano organizou a monarquia no mais extremo absolutismo, abolindo os últimos
vestígios republicanos. Foi o primeiro imperador que revestiu-se com uma capa
de terror e, à maneira dos monarcas orientais, exigia veneração à sua figura; qualquer
um que se negasse a se sacrificar por ele era perseguido e sofria pressões de
toda ordem, inclusive tortura e morte.
Galério, militar que governava as
províncias orientais, era um dos mais terríveis perseguidores de cristãos.
Chegou a propor a Diocleciano que todo aquele que se recusasse aos sacrifícios
em nome do imperador fosse queimado vivo. Diocleciano não queria tanto, mas
infligiu aos cristãos “penalidades rigorosas e eficazes” (Wells. H.G. Livro 2, páginas 261/262). De fato, Diocleciano
decretou que os templos dos cristãos fossem demolidos “até os alicerces” e que
fossem punidos com pena de morte todos os suspeitos de celebrar reuniões
secretas para o fim de culto religioso. Os filósofos que dirigiram a
perseguição ao cristianismo sugeriram que os bispos e presbíteros entregassem
todos os livros considerados sagrados aos magistrados, para que fossem
queimados em praça pública. Diocleciano decretou também o imediato confisco de
todos os bens da religião, que foram vendidos em leilão ou unidos ao domínio
imperial.
Mas os cristãos continuaram
resistindo, reunindo-se às escondidas. Diocleciano decretou, então, que todo
aquele que rejeitasse a religião da Natureza, de Roma e dos seus antepassados
fosse submetido “às mais intoleráveis e ásperas condições” (Wells, Op. cit.). Os cristãos nascidos
livres foram declarados incapazes de ter quaisquer honras ou exercer quaisquer
empregos. Os escravos foram privados para sempre de quaisquer esperanças de
liberdade. Os cristãos foram colocados fora da lei. Os juízes foram autorizados
a determinar toda e qualquer ação solicitada contra os cristãos. Já estes não
poderiam se queixar de absolutamente nada. Quando este edito (decreto) foi
afixado em Nicomédia, um cristão o arrancou, rasgou e discursou contra o
imperador. Foi preso e assado a fogo lento, para servir de exemplo. A história
não registrou o nome daquele mártir. A partir da rebeldia desse cristão, a
perseguição tornou-se mais feroz, cruel. E iniciou-se a Era dos Mártires, que
foi do ano de 303 ao ano 311, época em que, por qualquer motivo, cristãos eram
torturados e mortos.
Acabaram-se as perseguições e os
martírios quando Constantino assumiu parte do poder, em 312, adotando medidas
de proteção aos cristãos e, em 324, já como imperador, estabeleceu, como
religião oficial, o cristianismo. Foi um golpe duro nos seus pares e em todos
aqueles que se acostumaram a humilhar e roubar os que deles discordassem,
principalmente as pessoas acusadas de estarem ligadas à seita cristã. No leito
de morte, Constantino converteu-se ao cristianismo.
Sebastião foi um desses mártires que
preferiram morrer a negar a sua fé no Deus cristão. Soldado e servidor do
Império, em Milão, foi nomeado, por seu valor, capitão da primeira Corte da
Guarda Pretoriana (ou seja, a Guarda do Imperador). Mas Sebastião negou-se a
cumprir determinadas ordens do imperador contra os cristãos e, inquirido,
confessou ser um cristão. Diocleciano, que nutria admiração por ele,
aconselhou-o a negar sua fé. Sebastião manteve-se firme e acabou destituído da
Guarda e entregue a um pelotão para ser torturado e morto. Considerado traidor, Sebastião foi espancado,
amarrado num tronco e alvejado várias vezes com flechas. Sangrando muito, foi
deixado no tronco, ou porque pensassem os soldados que ele estava morto, ou
para que morresse lentamente. No entanto, uma mulher, Irene, esposa de um
mártir (Cástulo), passando pelo local, decidiu retirar o corpo de Sebastião e
sepultá-lo. Surpresa, constatou que ele ainda estava vivo. Tratou dele e,
tempos depois, estava Sebastião novamente desafiando o imperador e seu séquito.
Preso novamente, Sebastião, por ordem
do imperador, foi espancado até a morte. Alguns religiosos dizem que ele foi
morto a pauladas. O fato é que Sebastião foi torturado até a morte, mas não
negou a sua fé nem a sua religião. O ano de sua morte, segundo a Igreja, é 303.
No entanto, não há registros que confirmem esta data, o que gera dúvidas quanto
à morte de Sebastião e de outros cristãos.
A Igreja tem sua própria história e este trabalho não pretende colocar
em xeque os registros eclesiásticos. Antes, pretende registrar a fé no sagrado,
representado pela figura de São Sebastião, preservando os fatos nos quais os
cristãos acreditam. Crença tão forte que atravessa os séculos e chega
vivificada ao terceiro milênio.
No livro O Santo do Dia, Dom Servílio Conti afirma ser 303 o ano do martírio
de Sebastião. O militar foi sacrificado por não negar sua fé e proteger os
cristãos e, por isso, foi santificado pela Igreja Católica, que se tornou
religião oficial pouco tempo depois, em 325, quando foi realizado o primeiro
Concílio Geral (ecumênico) do mundo cristão, sob o império de Constantino.
No Cânon dos Mártires ou Martirológio Romano (local em Roma com o
nome dos mártires e a história de seus martírios) consta o nome de Sebastião,
inscrito em 354, data provável de sua santificação. A imagem conhecida e
cultuada de São Sebastião (do seu corpo amarrado a um tronco de árvore e
flechado) foi imortalizada pelos pintores da Renascença.
Não há provas, mas teria sido Santo
Ambrósio que escreveu sobre Sebastião. Segundo ele, Sebastião nasceu em Narbona,
Milão, onde também estudou. Não gostaria de ser militar, mas na tentativa de
defender os cristãos, ingressou no exército, em Roma, ainda no tempo do
imperador Carino, em 283 d.C. Este imperador foi morto por Diocleciano, que
assumiu o poder. Admirador de Sebastião por sua coragem e bravura, Diocleciano
nomeou-o centurião (do latim centurione que
significa comandante de uma centúria,
uma companhia de 100 soldados da milícia romana) de uma guarda pretoriana (do
latim praetorianu, guarda dos
imperadores da Roma antiga), uma grande honra para qualquer soldado.
Diocleciano foi para o Oriente e deixou em seu lugar seu amigo Maximiano, que também admirava
Sebastião por sua lealdade e bravura.
Todavia, as perseguições aos
cristãos tornavam-se cada vez mais intensas. O papa Caio, eleito em 283, foi
perseguido em Roma e escondeu-se no Palácio Imperial, nos aposentos de Cástulo.
Mas os romanos, comandados por Maximiano, prenderam os cristãos confessos e
torturou-os até a morte. Assim foi com uma mulher chamada Zoé, que foi
pendurada pelos calcanhares sobre uma fogueira e morreu sufocada pela fumaça;
Tranquilino foi apedrejado até a morte; Nicóstrato, Cláudio, Castório e
Vitorino foram presos, torturados e lançados ao mar; Tibúrcio foi decapitado;
Cástulo, traído por um amigo, acabou preso e enterrado vivo; Marcos e
Marceliano foram pregados pelos pés, de cabeça para baixo, numa árvore; em
seguida, assassinados a flechadas.
Contra essas atrocidades lutara
Sebastião, que tentava, a todo custo, proteger seus irmãos de fé. Mas a
proteção aos cristãos custou sua vida. Diocleciano, ao saber que Sebastião
ajudava os cristãos censurou-lhe e entregou-o aos arqueiros da Mauritânia para
ser executado. Dado como morto, foi, no entanto, salvo pela viúva de Cástulo.
Recuperado, em vez de fugir voltou a ocupar seu posto na guarda pretoriana e
discutiu com Diocleciano. Este, após a surpresa (pois o considerava morto),
chamou os guardas e ordenou-lhes que espancassem Sebastião até a morte. Seu
corpo foi sepultado por uma moça chamada Lucina num lugar denominado ad catacumbas, onde depois foi erigida a
Basílica de São Sebastião. Estes dados foram recolhidos por Butler que escreveu
o livro Vida dos Santos (Volume I, páginas 173-175). O autor, no
entanto, não afirma ser verdade os fatos narrados em minúcias. Mas não tem
dúvida de que Sebastião foi martirizado por ordem de Diocleciano e sepultado na
Via Ápia, bem próximo onde depois foi erguida a Basílica de São Sebastião, no
cemitério ad catacumbas.
No que tange a representação de São
Sebastião trespassado por flechas, Butler diz que “tal fato se deve aos
artistas da Baixa Idade Média”; e relata que um mosaico, provavelmente do ano
680, existente em San Pietro Vincoli, mostra São Sebastião de barba, levando em
uma das mãos uma coroa de martírio. E que em um vitral da catedral de
Estrasburgo o santo aparece como um cavaleiro com espada e escudo, mas sem
flecha. O que se sabe é que há uma lenda segundo a qual São Sebastião enfrentou
bravamente uma nuvem de flechas, sem sofrer um arranhão; por isso, passou a ser
patrono de arqueiros e soldados. O santo também era invocado contra doenças
contagiosas e contra pragas.
Sebastião é homenageado e festejado
pelos devotos no dia 20 de janeiro. Além da própria cidade do Rio de Janeiro,
muitas igrejas e paróquias no Brasil têm São Sebastião como padroeiro. Em
Campos a primeira capela em seu louvor foi erguida na localidade que recebeu o
seu nome e consta que é a segunda mais antiga da Baixada Campista. Lá, o santo
é festejado desde 1786, sendo uma das mais antigas manifestações religiosas do
município e do país.
(Trecho do meu trabalho sobre São Sebastião que espera por impressão)
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